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O FIM DO DESCONTO DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL |
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Recentemente escrevemos um breve comentário sobre autorização de desconto da Contribuição Sindical (que pode ser acessado aqui). Sindicatos pretendendo atribuir validade para autorização coletiva, dada em Assembleia, e empresas exigindo a autorização individual dos empregados para realizarem o desconto em folha, com receio de que a autorização coletiva não seja reconhecida como válida pela Justiça do Trabalho e eventualmente venham ser condenadas a restituir aos empregados os valores descontados.
A Justiça do Trabalho tem decisões em ambos os sentidos, como está retratado no comentário, já referido.
Pois bem. No dia 1º de março de 2019 foi publicada a Medida Provisória 873/2019, que trata o tema da contribuição sindical de maneira totalmente diferente. A MP altera alguns dispositivos da CLT e acrescenta outros.
Esta norma procura estabelecer de modo claro a forma de recolhimento das contribuições e mensalidades devidas aos sindicatos, sejam as previstas em lei, sejam as dispostas em norma coletiva (as convenções e os acordos coletivos de trabalho), ou ainda aquelas estipuladas nos estatutos das entidades sindicais, como é o caso da mensalidade sindical devida pelos associados.
Todas as contribuições devidas aos sindicatos estão sob a égide desta mesma regulamentação, independentemente da nomenclatura que tenham ou venham a receber. Estão abrangidas, assim, as contribuições sindicais, as confederativas, as assistenciais, as negociais, as mensalidades sindicais e outras que possam vir a ser criadas por instrumentos normativos (Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho).
As regras estabelecidas na MP valem tanto para as contribuições devidas para as entidades sindicais profissionais quanto para as patronais, ou seja, disciplina o recolhimento de valores para os sindicatos de trabalhadores e de empresas.
Com a nova disciplina jurídica dada pela MP, fica resolvido o principal ponto da polêmica que vinha se formando, após a Reforma Trabalhista, em torno da forma de autorização de desconto da contribuição sindical, isto é, se era ou não válida a autorização coletiva dada em assembleia, se era ou não preciso exigir autorização escrita e individual do empregado para realizar o desconto em folha de pagamento.
A partir de agora, não haverá mais desconto de quaisquer valores relativos ao sindicato profissional na folha de pagamento dos empregados.
A nova norma determina que os sindicatos (de trabalhadores ou de empresas), desde que autorizados previamente, remetam aos integrantes da sua categoria, um boleto bancário ou meio eletrônico equivalente, para que o pagamento seja feito diretamente pelo contribuinte, trabalhador ou empresa. Em outras palavras, o que fez a nova regulamentação foi acabar com o desconto em folha de pagamento dos empregados a título de contribuição sindical ou quaisquer outros valores devidos para as entidades sindicais e determinar que o recolhimento seja feito diretamente pelo trabalhador. Como regra geral, o boleto de cobrança deve ser enviado obrigatoriamente para a residência do trabalhador e apenas como exceção, para o endereço do empregador.
Observa-se que as contribuições devidas pelas empresas já eram realizadas desta forma, embora sem a exigência da autorização prévia para envio da cobrança.
Além disso, a vedação do desconto em folha e a sistemática de cobrança direta pelos Sindicatos, via boleto bancário, aplica-se também aos servidores públicos da União, regidos pela Lei 8112/90.
A MP preconiza, ainda, a nulidade de eventual norma coletiva que venha a estabelecer a compulsoriedade ou a obrigatoriedade do recolhimento a empregados/trabalhadores ou empregadores/empresas, mesmo que o assunto seja votado em assembleia e resultado de negociação coletiva.
Por fim, a MP 873 estabelece que somente pode ser cobrada dos “filiados”, isto é, dos associados, a contribuição confederativa, a mensalidade e as demais contribuições instituídas pelo estatuto sindical ou por negociação coletiva. Assim, somente a contribuição sindical é devida pelos integrantes da categoria que não sejam associados ao Sindicato.
Em síntese, essas são as alterações práticas quanto à cobrança das verbas que compõem o custeio do sistema sindical brasileiro.
É possível antever que haverá inúmeros desdobramentos que acabarão novamente postos para decisão do Poder Judiciário.
Um deles é a possibilidade de questionamento da constitucionalidade da MP, haja vista a necessidade de preenchimento dos requisitos de relevância e urgência, indispensáveis para a edição de toda e qualquer Medida Provisória, na forma do art. 62 da CF. A leitura atenta do texto revela outras possíveis inconstitucionalidades, que precisarão ser enfrentadas sob a luz dos princípios da autonomia e da liberdade sindical, bem como da autonomia privada coletiva, o que não cabe no espaço deste artigo.
A principal novidade trazida pela MP, que é a cobrança mediante boleto bancário, encontrará dura resistência nos Tribunais, quiçá também no STF, pois o texto do art. 8º,IV, da Constituição Federal, que trata especificamente da contribuição confederativa, prevê como regra geral o desconto em folha quando devida pela categoria profissional.
Outro inegável efeito será a repercussão negativa na vida financeira dos sindicatos. É notório que a MP dificulta sobremaneira o acesso dos sindicatos a recursos oriundos da própria categoria representada e que são indispensáveis para a organização sindical e das suas atividades.
Assim como ocorreu após a Reforma Trabalhista de 2017, que tornou “facultativa” a contribuição sindical, a tendência é que os Sindicatos busquem estabelecer novas formas de organização e de relação entre entidades sindicais no país, a fim de superar as dificuldades impostas pelas legislações recentes.
Para terminar, é bom lembrar que a Medida Provisória é uma espécie normativa editada pelo Presidente da República e que requer apreciação pelo Congresso dentro de 60 dias, sob pena de perder a eficácia.
Para ter acesso à íntegra da MP 873/2019, clique aqui.
Marcelo Wanderley Guimarães